quinta-feira, 12 de outubro de 2017

iluminar o sol

à luz que me ilumina,

Voltar a tocar a terra e encher a boca de sabores de infância: é assim o anúncio de férias.

Este ano o calor fez com que "tudo viesse mais cedo" nos campos, o milho já estava desfolhado e guardado em caixas, as uvas já se tinham tornado em vinho e o mosto estava prestes a ser aguardente.

Pelo chão iam-se espalhando as castanhas, entre as pedras dos caminhos reluziam azeitonas. Cedo se juntaram ripes, serra ou moto-serras a quebrar o silêncio da aldeia - nada como na infância em que grupos de homens e uma ou outra mulher se juntavam depois de seco orvalho, estendiam a roupa (panais) pelo chão, posicionavam as escadas armados com ripes e contavam histórias antigas entre o tilintar da azeitona na roupa. Almoçavam e à noite ceavam. A sopa com feijão e toucinho nas malgas aquecia-lhes o espírito, as batatas com bacalhau regadas com o azeite do ano anterior afagavam-lhes o estômago, adoçavam-no com arroz doce e creme, despertavam com o amargo do café.Deixavam-se levar pelo escuro da noite com uma arguardente e uns quantos cigarros a iluminar o jogo de cartas. Regressavam a suas casas cruzando caminhos. Voltavam ao leito onde as suas mulheres os esperavam. Aconchegavam-se até ao outro dia.

Por estes dias já não se vêem grupos de homens a subir oliveiras. Os poucos que o fazem vão cortando ramos para os que estão em baixo riparem. As oliveiras baixam os braços lá do alto, trazem mais luz aos campos vazios pela seca. Uns aqui outros ali enchem carrinhos de mão, regressam no silêncio das cantigas. Limpam a azeitona, guardam-na em recipientes com água até que chegue o dia de ir ao lagar, até que se transforme na luz dos próximos anos.