sábado, 28 de janeiro de 2017

ao encontro de mim

para o meu eu,




o desafio andava no e-mail há algum tempo, de vez em quando ressurgia, mas a sobreposição de actividades não deixava que o aceitasses - e eu que tanto queria experimentar algo assim: ficar longe da rotina e olhar para mim e para o ano (ou os anos) que agora começa.
o desafio era fazê-lo num ciclo criativo e afastada do dia-a-dia, mas não afastada do mundo, isto é convivendo com as pessoas do local olhando para dentro de nós mesmos. complicado de entender? não tu entendias bem, tu sabias que nunca estamos isolados e tens formas de olhar para ti com o mundo à tua volta.
e no último momento o mundo organizou-se para que que pudesses participar nesse retiro criativo, com yoga e meditação.

acordaste sem o peso do despertador da semana, tomaste o pequeno-almoço e organizaste a casa antes de apanhar o barco. procuraste gente com um tapete às costas, mas depressa percebeste que o teu processo de busca interior começava ali sozinha no meio de tanta gente, a fazer algo que desafia os teus medos: andar de barco.o tempo de viagem é curto, sabes disso. registaste a paisagem, deixaste que o sol te invadisse e chegaste ao destino.

no meio da multidão uma cara conhecida acena-te para te levar até ao sítio onde vais ficar. de quarto em quarto a tua escolha é-te apresentada.ficarás sozinha num mundo verde e branco, rodeada de buganvílias cor-de-rosa - que mais poderias querer. deixaste-te ficar sozinha na varanda, inundaste-te de sol antes de te inundares com o movimento das ruas, de trocar palavras com negociantes, de preencheres o teu olhar, de abraçares as outras mulheres que tinham acabado de chegar para o fim-de-semana.



o grupo estava completo, o sol ia-se escondendo em Dakar ao ritmo das asanas. as crianças olhavam curiosas para tais movimentos do corpo, riam enquanto cada uma mantinha o equilíbrio.a noite chegou na margem de sabores e terminou numa criativa chávena de chá. a descoberta? estava lá. sim, estava lá no interior de cada uma, em cada palavra escrita ou partilhada porque nos processos criativos não pode haver obrigação nem o silêncio é um lugar de todos.no silêncio quebrado pelo chilrear das aves nascia o sol, ajustavam-se os sonhos ao acordar, estendia-se o corpo nas asanas. o sol subia do outro lado da ilha. as gentes tomavam café e começavam a rotina do dia. o pequeno-almoço de pão, doce, manteiga, café e sumo de bissap ia enchendo a mesa depois do banho. o sol enchia o pátio e as ideias fluíam do coração para o papel.


a música enchia o espaço e as folhas enchiam-se de cores, as mesmas das saias rodas, que caminharam até ao último processo criativo: pintura sobre o vidro. 
tudo parecia fácil: as latas de tinta, a tinta da china, os pincéis, um lugar inspirador, corações cheios de certeza. 


o desafio estava em saber que se deve desenhar ou escrever ao contrário porque é desse lado que o vidro fica exposto. como na vida descobrir que os traços a tinta da china não se apagam, permanecem como permanece qualquer caminho interior.
a noite chegava no cais e com ela o barco de regresso à rotina dos dias. 
e tu sabes que qualquer processo criativo e de planificação precisa do próximo passo: a implementação, a monitorização. 
é um processo em movimento: bem-vindo 2017, bem-vindo o ano do galo que hoje se celebra a Oriente.

domingo, 8 de janeiro de 2017

Dezembro


Ao meu Dezembro,

Dezembro foi introduzido por Novembro e pela partilha de sabores no escritório.
Estava tudo apalavrado há algum tempo, mas na minha cabeça europeia não estava confirmado e não estando confirmado o bacalhau ainda estava cheio de sal, quando o telefone tocou no final do dia. Sim, claro que iria fazer o prato português prometido. Pois claro que ainda tinha de correr supermercados à procura de ovos e azeitonas e pensar em truques para tirar o sal ao bacalhau.

No dia seguinte, lá estava ele, o bacalhau à Brás a fazer companhia ao Etojai, rodeados de queijo e chouriço, a respeitar as diferentes religiões sobre uma toalha de lenços de namorados.




Dezembro estava ali a espreitar, cheio de eventos. Cheio de ventos e de areias.
Os arredores da cidade tornavam-se deserto, anunciavam o nascimento dos profetas, anunciavam uma nova idade.



















Este ano o nascimento de Mahomet celebrou-se em Dezembro, chamam-lhe o Maouloud ou Gamou. É dia de celebrar, de orar, de reflectir sobre a generosidade, de perdoar, de amar o outro. Os mesmos valores associados ao nascimento do outro profeta, Jesus.

Por cá, no Gamou não se trocam presentes. Num país que assinala as festividades das duas religiões, os presentes são trocados no Natal.


 







Mas na hora de trocar presentes na manhã de Natal, já eu sentia o calor do frio, o doce das rabanadas e das migas.
Já brindávamos à vida em família. Já trocávamos o bolo-rei por uma caminhada até S. Silvestre.



 



Dezembro meu, continua a ser vida, renovação e tradição.